segunda-feira, 26 de setembro de 2011

A DEMOCRACIA PICHADA

Compartilho da indigna­ção do presidente da Assem­bleia Legislativa do Ceará e de seus pares quanto à pichação na parede daquela Casa, bem como da avariação de um de seus banheiros durante mani­festação feita pelos professo­res no parlamento. O culpado tem de ser punido. No entan­to, o exagero que se deu ao fato, sendo alvo de páginas inteiras nos jornais, é despro­porcional à discussão que não está sendo feita pela grande imprensa e nem por aquela Casa Legislativa sobre os reais motivos da greve dos profes­sores.

A indisposição para o diá­logo e a arrogância do gover­nador aliadas ao silêncio dos nobres deputados levaram a comunidade escolar bater à porta da Assembleia para in­termediar um diálogo com o Poder Executivo. Naquele dia, surdos ao apelo dos profes­sores, os deputados votavam a lei da zona de segurança do governador, um antídoto às manifestações populares, fa­zendo-nos lembrar um dita­dor militar que dizia ter nojo do povo preferindo o odor de seus cavalos. Não houve um só deputado que viesse à rua falar com os professores em greve, nenhum subiu ao carro de som para prestar solidarie­dade aos professores.

No dia seguinte, a Justiça decreta a ilegalidade da gre­ve. Os professores continu­aram o movimento, duplica­ram os participantes, cerca de 10 mil pessoas, e voltaram às ruas, para apelar novamente para a dita Casa do Povo.
Naquela ocasião o patri­mônio da Assembléia foi da­nificado e as providências para punir o culpado já foram amplamente divulgadas. Mas a democracia representativa está pichada: primeiro pelo silêncio dos representantes do povo quanto ao grave pro­blema dos educadores do Ce­ará, fruto da ausência de uma oposição e de um Executivo autista que se recusa a dialo­gar; segundo, por uma Justiça tão ágil em criminalizar movi­mentos populares e tão lenta para julgar e fazer os culpa­dos devolverem os recursos surrupiados pela corrupção; terceiro por uma mídia sen­sacionalista que, por um ato isolado, nominam os profes­sores e alunos de vândalos.
Que tal senhor presiden­te se, além da investigação para apurar a tão propalada pichação e a avariação de um banheiro, a Casa do Povo li­derasse um amplo movimen­to anticorrupção no Ceará começando por uma CPI dos banheiros fantasmas? Só as­sim os recursos destinados à educação seriam suficientes para o governador cumprir a Lei do Piso em cima do Pla­no de Careira do Magistério. Os alunos voltariam às salas de aula e nós professores se­ríamos estimulados a falar de democracia como algo con­creto e não apenas como uma invenção dos gregos.

Ana Maria Afonso Braga - Professora de História da Es­cola de Ensino Médio Adauto Bezerra - Servidora do DNOCS - Coordenadora de Formação Política do SINTSEF/CE
Artigo publicado no Jornal O Povo, edição do dia 23 de se­tembro de 2011

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