sábado, 4 de junho de 2011

MÉTRICA, RIMA E TEMAS NO CORDEL TRADICIONAL


Material de autoria do Violeiro Fábio Sombra. Publicado originalmente no folheto “Proseando Sobre Cordel”.

Métrica e rima no cordel tradicional
Quando alguém canta ou declama versos de cordel logo se percebe o ritmo que vai se repetindo a longo da história. Esse ritmo é resultado da métrica, ou seja, os versos precisam ser construídos com o mesmo número de sílabas. No cordel, os versos possuem geralmente 7 sílabas. vamos tomar a seguinte estrofe como exemplo:

Nesse instante o magrilim
Com voz mansa e bem pausada
Disse olhando pra princesa:
- Ouça aqui, minha adorada,
Quero ver se você pode
Destrinxar essa charada.

Contando as sílabas poéticas do verso, teremos: NES-SEINS-TAN-TEO-MA-GRI-LIM = Sete sílabas.

Se transformamos as sílabas tónicas (pronunciadas com mais força) no som TUM, vamos encontrar o seguinte ritmo: TÁ-TÁ-TUM-TÁ-TÁ-TÁ-TUM = Sete sílabas. Note-se que esse ritmo segue sempre igual nos versosseguintes. Mas, as vezes, pode acontecer algo curioso. Observe-se o segundo verso: COM-VOZ- MAN-SAE-BEM-PAU-SA-DA = Oito sílabas (?).
Como é que pode? Os versos não deveriam todos ter sete silabas? Acontece que estamos falando de sílabas poéticas. Em poesia, a gente só conta as sílabas de um verso até a última tônica, aquela mais forte.

Nesse exemplo, a última sílaba tônica é AS, da palavra pausada. Portanto aquele DA que sobrou no finzinho não entra na conta, e a gente continua com sete sílabas poéticas. No início parece um pouco complicado, mas depois que o poeta grava esse ritmo na cabeça, os versos começam a surgir com grande facilidade.
Outra característica da poesia do cordel é o uso de rimas. No exemplo acima, encontram-se rimas no segundo, no quarto e no sexto verso: paus(ada), ador(ada) e char(ada). Já os versos 1,3 e 5 não precisam rimar com nenhum outro. Isso facilita a vida poética, que só precisa se preocupar em encontrar três rimas por estrofe.

Temas na Literatura de Cordel
São muitos e variados os temas encontrados no folheto de cordel. Alguns exemplos:
  • História do ciclo do cangaço;
  • Folhetos jornalísticos que falam de notícias regionais ou nacionais de grande repercussão e interesse geral;
  • Bibliografias;
  • Sátiras de cunho social ou sobre política e políticos;
  • Desafios e pelejas entre grandes violeiros;
  • Temas educativos ou de esclarecimento público, usados em campanhas de governos e prefeituras.
No entanto, os grandes campeões de vendas sempre foram mesmo os chamados romances, com narrativas de fantasia e encantamento. Esses folhetos trazem história de reinos misteriosos, localizados na Europa Medieval, na Ásia ou no Oriente. Neles, guerreiros lendários, princesas, e criaturas fantásticas adotam usos, costumes e até nomes bem brasileiros. Sendo assim, o leitor não precisa se assustar, se, num romance de cordel, encontrar o rei Carlos Magno descansando de uma batalha numa rede, aos pés de um cajueiro ou de dividindo uma rapadura com seus doze cavaleiros.

Os romances de cordel também criaram numa série de heróis populares que vencem seus inimigos através da astúcia e da esperteza, fazendo os poderosos de bolos preparando injustiças. Entre eles, os mais queridos são Pedro Malasartes, João Grilo e o Amarelo.
Desafios e Pelejas
O desafio é como uma batalha, só que travada em versos e ao som de viola. Quando dois poetas, bons de rima e improviso se encontram, daí pode surgir um desafio. O objetivo do desafio é desfazer-se do adversário, fazê-lo parecer ridículo ou abobalhado perante a platéia. No entanto, termos grosseiros, ofensas pessoais ou que envolvam a família do adversário não são bem recebidos pela família.

Ao ouvir o ataque que lhe é dirigido o adversário reage, sempre em versos rimados, desfazendo as acusações e lançando sua própria artilharia poética. Quando os adversários são experientes e talentosos, um desafio chega a durar horas e horas e se decide, geralmente, mediante uma das seguintes situações:
  1. A platéia aclama o vencedor através de gritos e palmas. Geralmente, ao final de uma saraivada demolidora de versos.
  2. Um dos adversários reconhece sua inferioridade e desiste da peleja por vontade própria.
  3. Um dos adversários não consegue encontrar resposta para alguma provocação que lhe é dirigida.
  4. Um dos adversários “empaca” e demora muito para encontrar a rima certa para seu verso.
  5. Um dos adversários apela para a violência física. Nesse caso ele é imediatamente declarado perdedor.
Para participar de um desses embates, o violeiro precisa possuir um grande domínio do ritmo e da arte de se improvisar. Pensamento rápido e jogo de cintura também não podem falar e já fizeram a fama de muitos cantadores.

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