Na última
quarta-feira (9/4), o Sesc e a Fundação Perseu Abramo apresentaram os números
preliminares da pesquisa Públicos de Cultura – Hábitos e Demandas. O objetivo
era ampliar o conhecimento sobre o público e orientar ações do setor. Para
isso, foram investigados o comportamento, a disponibilidade e a frequência com
que os entrevistados consomem ou produzem cultura, em 139 municípios em área
urbana de 25 estados, das cinco regiões do país.
Alguns resultados chamam a atenção, em especial os
que dizem respeito ao que não está no leque de atividades culturais dos
entrevistados: 61% nunca foram a uma peça de teatro em qualquer local (61%) e
57% nunca assistiram uma peça no teatro; 75% nunca foram a espetáculos de
dança ou balé no teatro; 71% nunca estiveram em exposições de pintura,
escultura e outras artes em museus ou outros locais; 89% nunca foram a um
concerto de ópera ou música clássica em sala de espetáculo e 83% em qualquer
outro local; e 70% nunca foram a uma exposição de fotografia.
Os
motivos para a não frequência a essas atividades se equilibram entre o não
gostar e o não existir algumas delas na cidade. É considerável a proporção de
respostas que indicam o fato de não terem costume e/ou não acharem
interessantes/importantes alguns desses tipos de atividades. 26% dos
entrevistados afirmam que não gostam de exposições artísticas e outros 26% que
não sabem ou nunca foram a uma.
No que
diz respeito à leitura, por exemplo, a maioria (58%) não leu nenhum livro nos
últimos seis meses e os que leram possuem uma média de apenas 1,2 livros lidos
no período. Os temas literários mais procurados são romance ou ficção, seguidos
pela bíblia e por livros de cunho religioso e espiritualista.
As
atividades cuja maior parte das pessoas entrevistadas afirmou já ter realizado
foram: assistir a um filme em casa ou outro lugar diferente do cinema (91%),
dançar em bailes e baladas (80%), ir ao cinema (78%) e ao circo (72%), ler um
livro por prazer (69%), assistir a um show de música em casa ou outro local
diferente de casas de espetáculos (69%) e ir a bibliotecas (58%).
Capital cultural - Para o sociólogo Sérgio
Micelli, presente no seminário de apresentação da pesquisa, a falta de
repertório adequado para o consumo de cultura é uma das principais causas do
que os entrevistados chamam de “não gostar” de determinadas atividades. “A
pesquisa mostra a prática cultural brasileira tal qual ela se dá. O problema
não é só de acesso, é de repertório. E o que está acontecendo é a constituição
de um padrão de consumo que não tem muito a ver com os equipamentos. Os
equipamentos se tornaram nichos para clientelas reduzidas. O retrato social da
audiência é muito peculiar e depende do cumprimento de uma série de exigências
de repertório”, afirmou.
Além
disso, há a concorrência com os meios digitais. “A possibilidade de acessar o
que antes exigiria ir ao Louvre, ou comprar uma enciclopédia ilustrada, se
tornou relativamente muito mais banal, embora a experiência online não seja a
mesma. Mas o acesso à cultura está franqueado, a pessoa pode ter da sua casa,
ou do seu celular. Há uma mudança acontecendo e os efeitos sociais e culturais
ainda não estão claros”, disse o coordenador da pesquisa, Gustavo Venturi.
A mobilidade social e material, tão falada nos
últimos anos e também apontada pela pesquisa, não se refletiu na mobilidade do
ponto de vista cultural, como também indicou Venturi. “Isso mostra que no plano
dos valores mais amplos essa mobilidade não foi suficiente. Nesse sentido, as
políticas culturais são fundamentais para uma mudança efetiva da sociedade. Não
basta, ainda que seja necessário e legítimo, elevar a qualidade de vida do
ponto de vista material da população, os horizontes de transformação social
ainda estão distantes e me parece que é difícil chegarmos lá sem mexermos nessa
questão do capital cultural.”
Como os
gestores de cultura podem direcionar suas atividades nesse caminho, então?
Segundo Micelli, promovendo a exposição continuada, com um padrão, o que terá
consequências em termos de política cultural. “A arena da atividade cultural é
de enfrentamento e competição. Há diversas instâncias em luta e rivalidade,
hostis, em relação ao poder e à legitimação. A televisão está o tempo todo
dizendo que a visão dela é a certa. É um enfrentamento. E ele não será
resolvido por reconciliações imaginárias. A indústria cultural espelha uma
prática cultural dominante na sociedade brasileira”, alertou o professor.
Para Venturi, o investimento nos equipamentos
culturais é um dos modelos a serem adotados. “É o questionamento desse modelo
que nos permitirá ir além da indústria cultural.”
Indústria cultural – No que concerne à TV, 62% dos
entrevistados afirmam assistir apenas aos canais abertos e 28% tanto a TV
aberta quanto a por assinatura. Os principais produtos culturais vistos na TV
são as novelas (54%), filmes (52%) e os jornais de notícias (44%). Entre os
filmes prediletos, estão os de aventura (39%), comédia (38%) e romance (29%),
com preferência pelo cinema americano (45%) e menos pelo nacional (33%). Cerca
de 65% das pessoas vêem filmes nacionais de vez em quando, enquanto 22% sempre
e 14% disseram nunca assisti-los.
Com
relação aos gostos musicais, os gêneros mais mencionados foram: sertanejo, MPB,
Forró, Gospel e Pagode; e as principais danças foram o Forró, a Dança de salão,
Samba e Street Dance/Rap. No que diz respeito aos gêneros de teatro, o
preferido, com grande distância, é a comédia. Com relação a outros tipos de
apresentação, destacam-se o circo, as comédias stand up e os teatros de
bonecos.
A maioria
das pessoas entrevistadas afirma gostar de observar os principais elementos
culturais e artísticos da cidade, tais como parques (89%), arquitetura em geral
(73%), luzes artísticas e decorativas (70%), monumentos e estátuas (68%),
propaganda e publicidade (54%) e grafites/murais (49%).
Os
principais locais visitados quando se deseja fazer alguma atividade cultural
nos fins de semana são os shoppings, cinemas, parques, igrejas, teatros,
restaurantes e outros espaços de alimentação e praças. A maior parcela se
dedica, nos lugares citados, a atividades de entretenimento e atividades
culturais, com uma pequena participação de atividades esportivas e religiosas.
Um dado curioso é que, na percepção de 51% dos entrevistados, nenhuma atividade
cultural é feita por eles aos fins de semana. Essa proporção chega a 85% entre
segunda e sexta-feira, de forma que a principal atividade cultural citada passa
ser a ida a igrejas e outros locais religiosos.
“Cada vez
mais eu vejo que temos muitos capitais culturais. Não existe um único caminho.
Passa pela construção e mudanças dos diversos capitais culturais, a partir de
uma troca efetiva entre eles”, concluiu Márcia Costa Rodrigues, gerente de
cultura do Departamento Nacional do Sesc.
Tags:capital cultural, consumo cultural, cultura, indústria cultural, MERCADO, pesquisa, POLÍTICA,públicos de cultura, sesc
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